Romaria de S. Bento do Cando
Data: Três momentos anuais - 21 de março, 3 de julho e 10 de agosto
A romaria de S. Bento do Cando é uma das mais tradicionais do Alto Minho. Decorre na branda de S. Bento do Cando, da freguesia da Gavieira, em Arcos de Valdevez. A romaria remonta, segundo as informações mais seguras, ao século XVII (importa sublinhar que a capela foi mandada construir por capítulo de visitação, em 1651) e realiza-se em três momentos anuais: o primeiro celebra-se a 21 de março, dia em que se lembra a morte de S. Bento; o segundo tem início no dia 3 de julho, com a celebração da novena em honra de S. Bento do Cando, que termina no dia 11, dia principal da romaria. Neste dia há celebração da eucaristia, sermão e procissão. Um terceiro momento festivo foi introduzido em 1997, no dia 10 de agosto, justificado pela forte emigração destas terras, dando oportunidade aos emigrantes de viverem a festa e rezarem a S. Bento do Cando.
Os romeiros de S. Bento do Cando são, essencialmente, para além do concelho de Arcos de Valdevez, as pessoas vindas dos concelhos vizinhos de Melgaço e Monção. Deslocam-se à branda de S. Bento do Cando, para cumprir a novena, a meia novena, pagar as suas promessas ou pedir proteção e saúde para si e para os seus familiares. Repetem este ritual ano após ano para se encontrarem e falarem de perto com S. Bentinho ou Sr. S. Bento, como carinhosa e respeitosamente o tratam.
Uma outra característica desta romaria, comum a outras festas religiosas de montanha, em locais isolados das povoações, ou onde a distância de origem dos romeiros não possibilitava conciliar a frequência das novenas preparatórias com a pernoita nas suas próprias casas – é o da existência, nas imediações do Terreiro da Capela, de habitações destinadas à permanência dos romeiros durante as cerimónias religiosas. A essas habitações dão-se o nome de ‘quartéis’. Quem faz a gestão destes quartéis são os responsáveis pela Mesa da Confraria. Em S. Bento do Cando há quartéis destinados aos romeiros das freguesias de onde tradicionalmente saem o maior número de pessoas. Pela localização e práticas associadas às brandas e inverneiras, a romaria de S. Bento do Cando define-se pelos rituais e celebrações populares, tanto religiosas como seculares e lúdicas. Caminha-se de noite para o Cando e, chegados, festeja-se vibrantemente a cultura musical e da dança. Também aqui o percurso dos romeiros obedece a tradições de uso dos caminhos ancestrais que ligavam o Cando a outras localidades.
A origem da capela está no século XVII e foi mandada construir pelos monges do Mosteiro de Santa Maria do Ermelo, que por aqui passavam a caminho dos outros mosteiros cistercienses do Alto Minho e Galiza. A prática dos monges foi seguida pela prática dos habitantes deste território, muito crente no poder do Senhor S. Bento, para a cura dos seus males e para, em momento de festa, encontrar e viver as sociabilidades e rituais de enamoramento.
Conjunto edificado
A Capela de S. Bento do Cando não tem a dimensão dos grandes santuários. Talvez ela tenha tido uma pequena ermida anterior à sua construção no século XVI, pois os mosteiros cistercienses foram erigidos nos séculos XII/XIII, e as viagens entre os mosteiros já deveriam ser frequentes antes da construção deste templo. Foi recentemente, século XXI, sujeita a obras, principalmente no exterior, numa reorganização espacial a conferir-lhe maior dignidade e maior capacidade de acolhimento aos romeiros. Morto o velho carvalho que todos reconheciam como fazendo parte do histórico terreiro de S. Bento do Cando, foi mais fácil essa reorganização.
Tem o templo uma só nave, numa arquitetura de traça regional do séc. XVIII, neoclássica, com torre sineira do lado esquerdo da porta principal. No conjunto urbano do Cando, no entanto, esta igreja sobressai entre a rudeza das casas graníticas e dos quartéis dos romeiros. Extremamente bem cuidada na atualidade, ela está no centro de um terreiro cercado por habitações, onde também se encontra, na extremidade sul, o cruzeiro da capela e, na proximidade, um fontanário de duas bicas, antropomórficas. O altar principal, de S. Bento, tem um retábulo simples, do séc. XIX. Antes do Arco Cruzeiro, dois pequenos altares laterais, inseridos na parede, quebram e equilibram os panos das paredes laterais. Na parede exterior virada a nascente temos um nicho onde se representa, em azulejo policromo, S. Bento. Os romeiros sempre que o cruzam ao fazerem a romaria, cumprimentam-no, não sendo surpresa vermos os crentes a ‘rezar/conversar’ com o Senhor Sr. Bento, como se de um próximo se tratasse! Nas janelas abertas da fachada principal encontramos com frequência pequenas pedras, com as quais os romeiros contabilizam as vezes que já circularam à volta da capela, para cumprirem bem a promessa. Na casa da Confraria, situada do lado poente, podem-se comprar ou alugar ex-votos, que acompanham os romeiros durante a promessa.
O espaço sagrado definido pela romaria cumpre-se entre a capela de S. Bento do Cando, o cruzeiro do terreiro e a parte inferior da aldeia do Cando, a cerca de 300 metros, onde as procissões (a das Velas e a principal do dia da Festa) vão, dando a volta num terreiro ao lado esquerdo da estrada principal, para, depois, regressarem à Capela.
O contexto territorial da romaria
Não se entende o contexto desta romaria sem entender a geografia do espaço onde está implantada a capela, ou seja, a Branda de S. Bento. Estes assentamentos humanos têm, desde a origem, a marca da mobilidade, pois os que aí habitam seguiam uma tradicional residência sazonal: no inverno habitavam a parte mais baixa da freguesia, nas inverneiras, e, no verão, subiam para os povoados das zonas mais altas da montanha, as brandas. Assim, a experiência de percorrer os caminhos entre locais de residência sazonal, ou nos percursos de pastoreio e de relações com as freguesias vizinhas, deu a estes habitantes um profundo conhecimento das serras, sabendo bem por onde podiam caminhar e fazer os percursos com segurança e num menor espaço de tempo. Na maior parte das vezes, os romeiros de S. Bento do Cando, vinham das brandas e inverneiras da freguesia da Gavieira, das freguesias vizinhas de Melgaço, Monção e Arcos de Valdevez, as quais tinham também essa experiência e conhecimento da montanha. De tão isoladas estarem os núcleos residenciais, a experiência do encontro nas romarias era procurada e celebrada como o momento excecional do ano. Aí rezam, negoceiam e se enamoram, superando a permanente autarcia das economias locais e os riscos das relações sociais endogâmicas.
Passar por estas terras é ver os socos graníticos das serras, tendo no sopé o escalonamento das pequenas rechãs, em patamares, após as casas, rodeados por espigueiros e azenhas; ouvir nas corgas fundas a água abundante em épocas de chuva e mais rara no estio, a dar fertilidade ao milho e feijão, expulsando o gado para a alta montanha, quando a terra é lavrada; ver o recuo do carvalho (Quercus) para as zonas baixas de maiores declives, após a queima da floresta e o arroteamento dos patamares; olhar as construções graníticas, dada a abundância de pedra, numa paisagem austera, mas forte e perene. Era isto o que experienciavam os romeiros e é ainda hoje a paisagem vivida pelos atuais romeiros de S. Bento do Cando.
Destaques:
Os Quartéis
Falar dos quartéis de S. Bento do Cando pode parecer despropositado, quando nas proximidades temos um outro conjunto de quartéis com qualidade e dimensão muito maiores. Falamos dos quartéis de Nossa Senhora da Peneda (Nossa Senhora das Neves), ali construídos pelo facto do lugar não ser habitado até bem dentro do século XVII. Os peregrinos à primeira ermida pernoitavam em acomodações precárias, no espaço envolvente, como abrigos de pastores (era uma branda da Gavieira e do Soajo) ou até grutas e lapas entre a penedia. É a necessidade, com o aumento dos romeiros, e a oportunidade das novas obras do séc. XVIII a proporcionarem instalações condignas nos quartéis. Em S. Bento do Cando, branda da Gavieira, havia a sazonalidade residencial, ou seja, as famílias tinham uma habitação no Cando para os seus pastores passarem ali o verão, junto dos gados, e cultivarem as parcelas de terreno, principalmente o feno. Mas eram habitações escassas para as necessidades dos romeiros que queriam seguir a novena preparatória da grande festa. É então que surgem os quartéis, construções simples em pedra, com grandes dormitórios, para pernoita dos romeiros. Eram construções muito rudimentares. O objetivo era ter um espaço seguro e abrigado para a dormida e para confecionar as refeições normais do quotidiano de uma população serrana. A privacidade não existia, o que obrigava a regras de conduta controladas por responsáveis dos quartéis. No século XX estes quartéis foram sendo melhorados, com a construção de quartos e casas de banho. Em S. Bento do Cando as freguesias e aldeias vizinhas têm o seu próprio quartel, mesmo que a gestão deles seja feita pela Casa da Irmandade. Alguns romeiros reservam lugar nos quartéis de um ano para o outro, garantindo, assim, que estão perto do centro da romaria, pois os quartéis situam-se todos na proximidade da capela. Alguns romeiros, durante os eventos festivos, ficam nas varandas dos quartéis, donde participam nos rituais religiosos e no grande arraial noturno da festa.
Falar dos quartéis de S. Bento do Cando pode parecer despropositado, quando nas proximidades temos um outro conjunto de quartéis com qualidade e dimensão muito maiores. Falamos dos quartéis de Nossa Senhora da Peneda (Nossa Senhora das Neves), ali construídos pelo facto do lugar não ser habitado até bem dentro do século XVII. Os peregrinos à primeira ermida pernoitavam em acomodações precárias, no espaço envolvente, como abrigos de pastores (era uma branda da Gavieira e do Soajo) ou até grutas e lapas entre a penedia. É a necessidade, com o aumento dos romeiros, e a oportunidade das novas obras do séc. XVIII a proporcionarem instalações condignas nos quartéis. Em S. Bento do Cando, branda da Gavieira, havia a sazonalidade residencial, ou seja, as famílias tinham uma habitação no Cando para os seus pastores passarem ali o verão, junto dos gados, e cultivarem as parcelas de terreno, principalmente o feno. Mas eram habitações escassas para as necessidades dos romeiros que queriam seguir a novena preparatória da grande festa. É então que surgem os quartéis, construções simples em pedra, com grandes dormitórios, para pernoita dos romeiros. Eram construções muito rudimentares. O objetivo era ter um espaço seguro e abrigado para a dormida e para confecionar as refeições normais do quotidiano de uma população serrana. A privacidade não existia, o que obrigava a regras de conduta controladas por responsáveis dos quartéis. No século XX estes quartéis foram sendo melhorados, com a construção de quartos e casas de banho. Em S. Bento do Cando as freguesias e aldeias vizinhas têm o seu próprio quartel, mesmo que a gestão deles seja feita pela Casa da Irmandade. Alguns romeiros reservam lugar nos quartéis de um ano para o outro, garantindo, assim, que estão perto do centro da romaria, pois os quartéis situam-se todos na proximidade da capela. Alguns romeiros, durante os eventos festivos, ficam nas varandas dos quartéis, donde participam nos rituais religiosos e no grande arraial noturno da festa.
Contactos
Gavieira, Arcos de Valdevez ( Viana do Castelo )
41.97238340244201,-8.258775354242761 (Ver mapa)