S. Bento de Fiães
Data: 11 de julho
Tratando-se de um mosteiro cisterciense, de alguma forma poderoso e rico, o culto a S. Bento teria aqui forma diferente do de tantas capelas dedicadas a este santo no Alto Minho. De facto, o culto a S. Bento está distribuído por todo o lado e o Alto Minho não é exceção. Na realidade as romarias de S. Bento seguem no Alto Minho dois eixos: o que vai de S. Bento do Ermelo a Fiães, passado por S. Bento do Cando, e o que atravessa a parte central do Alto Minho, desde S. Bento de Cossourado a S. Bento de Seixas.
S. Bento é um santo de devoção popular, por ser milagroso e atento aos pequenos problemas das pessoas, venerado nas pequenas capelas e altares. É também o santo de uma elite religiosa, a dos mosteiros beneditinos, de grandes templos e riquezas, que povoaram com o seu patronato as terras mais afastadas do nosso território. Do altar dos mosteiros, onde o povo admirava a presença e poder, ao altar das capelas e igrejas semeadas pelos lugares das freguesias, S. Bento povoa o nosso imaginário religioso
Tão poderoso é que se celebra duas vezes ao ano: a 21 de março, festa do trânsito, isto é, da morte de S. Bento – é o S. Bento da Primavera ou do cuco, como diz o povo; e a 11 de julho, festa da solenidade ou patrocínio, isto é, da Trasladação das Relíquias, agora o S. Bento, Padroeiro da Europa, e que é o S. Bento do Verão ou das Pêras (‘pedras’) como diz o mesmo povo. É, portanto, um santo milagreiro, especialmente invocado, por razões terapêuticas, para curar doenças da pele e males ruins. A ele se deve oferecer cravos e ex-votos segundo a promessa. É o santo de tantos versos de romeiros ou das orações populares: "São Bentinho milagroso nos livre das coisas ruins, dos males desconhecidos e dos maus vizinhos da porta!”.
No Mosteiro de S. Bento de Fiães também se celebra, no dia 11 de julho, a grande festa romaria de S. Bento. Ali acorrem romeiros das freguesias vizinhas e distantes, inclusive da Galiza, para viverem um dia de festa. Subir da Vila de Melgaço e freguesias das redondezas ou descer de Alcobaça ao local do vetusto mosteiro, para rezar a S. Bento de Fiães é cumprir com a tradição e trazer o farnel para repartir pela família. Todos se preparavam para a festa com música e merendeiros, em grupos de romeiros e bandos de amigos.
Edificado
Do antigo mosteiro beneditino/ cisterciense de Santa Maria de Fiães resta apenas a sua Igreja. Uma igreja românica, de grande envergadura, não se sabendo se o que chegou até nós é apenas o templo restaurado a partir do momento da introdução da observância cisterciense, ou ainda resta nele algo do anterior período beneditino. Há documentação sobre o anterior período beneditino, momento em que D. Afonso Henriques o coutou, em meados do séc. XII. No final desse século passa para a Ordem de Cister, filiado em S. João de Tarouca.
Temos uma igreja de três naves, separadas por arcadas longitudinais de arco em volta perfeita. A cabeceira introduz a renovação cisterciense, com planta quadrangular, tripartida e escalonada. A abside, abobadada, é iluminada por duas frestas. Realce-se o facto de ter pouca decoração, que era abundante na arquitetura religiosa românica, comprovando o ideário dos cistercienses da simplicidade e austeridade.
Contexto territorial da romaria
No passado, como convinha a um Mosteiro Cisterciense, onde os monges estavam em clausura, procurando, por isso, locais afastados dos povoados, mas garantes da sua sobrevivência, o culto a S. Bento era feito pela comunidade dos religiosos. Dentro da cerca do mosteiro, o trabalho, o estudo e a oração eram a vida quotidiana dos monges. Celebrar o Santo Patrono era celebrar a famosa ‘Regra’ que geria as suas vidas. A abertura destas celebrações às comunidades laicais vizinhas aos mosteiros, apesar de ser possível anteriormente, nas missas para a comunidade, só atingiu a dimensão pública e devocional com a transformação dos templos dos mosteiros em Igrejas Paroquiais. Desapareceram em muitos locais as cercas e até os edifícios dos mosteiros. Desapareceram ou foram ocupados por novos proprietários, neste caso leigos. No passado os monges mandavam construir templos e capelas pelas freguesias suas dependentes e através delas faziam uma catequese litúrgica e espalhavam o culto e invocações a santos, para reforçar o poder da ordem religiosa a que pertenciam. Agora é a grande igreja aberto ao culto, onde a paróquia se encontra e onde ainda prevalecem as imagens e o patronato de S. Bento. Dada as distâncias, entre os povoados e os mosteiros, o ato de peregrinar a esses locais foi transformando-se em ritual importante. Ainda hoje, na Romaria a S. Bento de Fiães esta dimensão da deslocação é um dos elementos que a define, junto com o convívio após os atos religiosos.
Destaque
Os terreiros, árvores e fontes dos santuários
No terreiro do Mosteiro de Santa Maria de Fiães, onde se celebram as Festas e Romaria a S. Bento, somos bafejados pela sombra de frondosas árvores, algumas centenárias. Parte das mais ricas árvores históricas e patrimoniais do Alto Minho encontram-se nos terreiros de capelas e santuários, sejam eles ou não de montanha. Tal acontece porque as árvores mais ancestrais dos espaços florestais e serranos, ou foram abatidas ou foram vítimas de incêndios. Por outro lado, a construção de alamedas e parques circunscritos aos terreiros de romaria acrescentava-lhes prestígio e davam aos romeiros e peregrinos uma experiência fora do comum. Eram, ao mesmo tempo, um espaço de lazer, abrigados do sol, onde celebravam a festa com as mais diversas performances populares e realizavam a comensalidade festiva. E eram também um espaço ‘paradisíaco’, que os transportava para a dimensão espiritual, na medida em que se destacava dos espaços comuns. Os conventos e mosteiros, dentro das suas cercas, já tinham a organização arbórea e vegetativa do espaço monacal. Mas nada como investir nos terreiros e parques das capelas e santuários. Não só se preservavam espécimes endógenas, como o carvalho, o sobreiro, o pinheiro e até o castanheiro, como se introduziam outras exógenas e exóticas, vindas das terras de África, das Américas e da Ásia, dando um ar de cosmopolitismo e exotismo, o que reforçava o prestígio dessa capela ou santuário. Não raros santuários têm ‘fontes santas’ ou miraculosas. Às nascentes junto destes santuários era-lhes atribuída essa sacralidade, sendo também fontes de cura. É este o caso em Fiães, com a miraculosa Fonte da Madalena. A existência aqui de fontes virtuosas (‘fontes caldas’) até fins do século XVII, fez com que no século XVIII, sob ordem de Frei Félix de Cerveira, se organizasse o terreiro com alameda de árvores e a construção da atual Fonte da Madalena. O mosteiro abra-se à comunidade e organiza o espaço exterior para a fruição dos romeiros, facilitando o acesso e criando o espaço sagrado, entre as árvores, fonte e templo.
Contactos
Melgaço ( Viana do Castelo )
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