Romaria de São Bartolomeu
Data: 19 a 24 de agosto
A Romaria de S. Bartolomeu, em Ponte da Barca, adquiriu nas últimas décadas uma proeminência no território barquense e vizinho. A pequena capela de S. Bartolomeu quase se perde dentro da envolvência da festa, vivida em todas as ruas e avenidas da vila de Ponte da Barca. O dia 24 de agosto é a celebração da memória e tradição transmitida de geração em geração, uma experiência quase iniciática para os mais jovens e de saudade e recordação do folguedo para os mais velhos. Sentir-se barquense é estar e viver a festa de S. Bartolomeu em todas as suas dimensões. Desde a construção da capela de S. Bartolomeu, no século XVIII, a romaria vai-se expandindo por toda a vila, assumindo grande relevância no século XX.
À vila acorrem romeiros das várias freguesias do concelho, no passado para a feira (a do gado e a do linho) e rituais religiosos; agora, para o cortejo etnográfico (o primeiro em 1958), para os eventos de cada dia, para a grande noite de arraial, para rezar ao S. Bartolomeu, pedindo as graças da cura de doenças da pele e outras associadas aos males do corpo e alma. Mas os romeiros vêm de terras mais distantes, e até da Galiza, pela fronteira da Madalena, atraídos pela festa e pela participação em rituais de convívio onde a arte da dança e do cantar a todos congrega. Passa a ser a festa um lugar onde se manifestam a tradição das rusgas e da dança do vira.
Fazer a romaria ao S. Bartolomeu da Barca é descer e subir a rua principal da Vila, individualmente, em grupo ou inserido numa rusga, tocando e cantando; é visitar a capela do santo padroeiro e nela rezar, cumprindo as promessas; é entrar pelos espaços de lazer e partilha da comensalidade, refazendo as forças físicas e fortalecendo os laços familiares e de novos amigos. Mas, para sentir e resumir a grande festa, é integrar a dança na Roda da Urca. O corpo perde a dor e a alma ganha voos e sensações quase místicas, quando os corpos se transformam em música, num movimento quase contínuo, quase eterno. Mas outro momento se impõe: o dos rituais religiosos e o da Procissão Solene. Nele resume-se a fé da comunidade e a sacralização das ruas, numa festa concelhia em memória da identidade local e de celebração da identidade histórica, sempre renovada cada ano.
Edificado:
A arquitetura religiosa deste edifício do século XVIII denuncia aperfeiçoamento e enobrecimento do templo, nas intervenções da fachada. Desde a fachada ao altar-mor, com seu retábulo, e a imagem do padroeiro S. Bartolomeu, sobressaem os elementos clássicos. Temos aqui uma pequena construção, de planta longitudinal retangular, de uma só nave, ou seja, uma capela devocional que não alterou com o tempo a estrutura inicial, mesmo situando-se no centro de Ponte da Barca e sendo a ermida da principal festa concelhia. Não há precisão na data da construção, apesar de o púlpito ostentar o ano de 1758. Será certamente da primeira metade do século XVIII, pois quando, no século XIX, há referências às festas de S. Bartolomeu, atribuem-lhe uma certa ancestralidade, mas não o suficiente para preceder essa data referida.
A fachada principal apresenta-se em empena assente em pilastras, com sobreposição de cornijas. Há uma harmonia nesta fachada, fenestrada de cada lado do portal, pela decoração arquitetural que encima cada uma delas. Parece ter existido uma prévia arquitetura simples, vernacular, a que foi acrescentada uma cenografia clássica, maneirista. Nota-se que a elaborada janela a encimar o portal remete para uma transformação posterior, para grande efeito cénico, dando-lhe a orientação vertical que culmina no crucifixo, onde termina toda a fachada.
No interior, ao fundo, o retábulo em madeira, maneirista, de organização clássica, em três partes, apresenta a edícula central onde está S. Bartolomeu, ladeada e encimada por painéis pintados. Destacam-se o púlpito e os frontais do supedâneo decorados com motivos fitomórficos relevados.
Contexto territorial da romaria
Temos na romaria de S. Bartolomeu da Barca mais uma expressão do poder atrativo das festas em centros urbanos. De alguma forma a romaria cresce com o aumento do poder económico e político da própria vila de Ponte da Barca. A devoção religiosa a S. Bartolomeu segue a crença de outros lugares, onde ele é padroeiro dos males da pele e de alguns problemas que afetam o comportamento normal das pessoas, nomeadamente a epilepsia. O não se entender este estado de ataque epilético e a frequência das doenças da pele, por questões de higiene e alimentares, levou os crentes a se devotarem a este santo. Dois fatores se acrescentam: o de relacionarem o poder do santo de curar os males da pele com o seu martírio (esfolado) e o poder de dominar o mal (o mafarrico); e o de existir fontes ou grandes cursos de água na proximidade, pela relação direta entre a água e a cura dos males da pele.
Na atualidade esta romaria atrai inúmeros romeiros do exterior, mas ela é, essencialmente, uma demonstração da cultura barquense. E é essa marca identitária que herda da sua história: as feiras do gado e do linho; as amostras e concursos do traje; o cortejo com as tradições; os rituais religiosos por todos celebrados. O que aqui se vive excecionalmente, é o que o território vive quotidianamente. No dia da festa exagera-se essa expressão, o propósito de a evidenciar, primeiro ao barquense e, depois, aos forasteiros.
Destaque
A Roda do Largo da Urca
Há romarias que se destacam por vários eventos ou espaços festivos, seja nos rituais seja no parque ou grandiosidade do templo religioso. Na romaria de S. Bartolomeu da Barca queremos destacar um dos seus componentes mais tradicionais e singulares: a Roda do Largo do Urca ou, simplesmente, Roda do Urca.
Se os anúncios festivos para o arraial referem os grandes grupos musicais e ranchos folclóricos, as rusgas, os viras, as chulas, os cantares à desgarrada, etc., todos os que conhecem a noite de S. Bartolomeu, mais cedo ou mais tarde, confluem para o Largo do Urca. O facto deste inultrapassável espaço atrair o romeiro mais atento ou aquele que quer viver plenamente a dança, ao som da concertina, bombos e castanholas, é ele, apesar de ser pequeno e, muito por razão disso, a oferecer uma experiência de comunhão como nenhum outro lugar. Livremente, apenas sabendo os passos da dança e disponibilizando o corpo, cada romeiro é atraído para a roda que circula vertiginosamente no espaço exíguo. A partir do momento em que nela se penetra, já não é um indivíduo, mas um corpo coletivo, um apelo voraz a uma fagocitose inebriante. Sob a voz de comando de um dos dançarinos, os corpos viram e reviram, em movimento contínuo. Os corpos lá permanecem por muito tempo, até esgotarem as forças, ou sair, num esforço de corte com um mundo que permanece ainda. Dá a sensação de ser um animal vivo a que cada um empresta um membro, para depois o resgatar, mas sem ter capacidade para o destruir. É essa a força da Roda do Urca!
Contactos
Ponte da Barca ( Viana do Castelo )
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