Romaria de Nossa Senhora da Bonança e Procissão ao Mar da Senhora da Ínsua
Data: Segundo fim de semana de setembro
No concelho de Caminha, depois da Romaria de S. João d’Arga, a festa e romaria mais importante é a de Nossa Senhora da Bonança, onde se integra a procissão ao mar e ida ao Forte da Ínsua buscar a Senhora da Ínsua. Se a primeira romaria, S. João d’Arga, tem todas as caraterísticas das romarias dos santuários de montanha, estas singularizam-se por serem romarias onde o mar, o oceano, é o contexto mais relevante. É a grande romaria dos pescadores de Vila Praia de Âncora e de Caminha. As origens do convento e culto à Senhora da Ínsua estão envolvidas em lenda, no milagre de, bem dentro da foz do rio Minho, onde o mar abraça os muros do antigo convento e do atual forte, ter nascido uma fonte de água cristalina, dando vida e segurança a todos os que ali se recolhiam. É o milagre da água doce na origem do culto à Senhora da Ínsua; é o milagre de sobreviver ao mar salgado, a razão da devoção à Senhora da Bonança.
No primeiro dia da centenária Romaria da Senhora da Bonança, em Vila Praia de Âncora, sempre em setembro, vão os pescadores devotos à pequena ‘ilha’, onde está construído o Forte da Ínsua, buscar a imagem milagrosa da Senhora da Ínsua. Chamam-lhe a "Procissão Naval de Nossa Senhora da Ínsua” ou "Procissão Naval do Encontro em Honra de Nossa Senhora da Ínsua e Nossa Senhora da Bonança”. Seguem em barcos engalanados a buscar a "Senhora” para tê-la consigo até ao domingo da festa da Senhora da Bonança, ‘guardando-a’ na Capela do Senhor dos Aflitos. A chegada da ‘Senhora’, é presenciada por uma multidão de fiéis e curiosos, posicionados nas margens e no portinho, ansiosos pela sua vinda e pelo futuro ‘Encontro’ das ‘Santas Nossas Senhoras’, mães queridas de devoção popular entre os pescadores.
São muitos os eventos religiosos e culturais nesta grande romaria da Bonança, entre música das filarmónicas, do folclore, dos bombos, verbenas de cantares ao desafio, cortejos etnográficos, como o do Vale do Âncora, tão rico em tradições populares e arquitetura vernacular. Com a Senhora da Ínsua e a Senhora da Bonança os pescadores da parte mais setentrional de Portugal celebram a crença no milagre da vida, a bonança, o milagre do mar acolhedor e rico de pescaria.
Edificado
Tratamos aqui do edificado da Capela de Nossa Senhora da Bonança, localizada dentro de Vila Praia de Âncora, concelho de Caminha. Está virada a poente a fachada principal, harmoniosamente inserida no pequeno largo para onde se abre.
Tem uma só nave, em planta longitudinal. A capela-mor é mais baixa e ligeiramente mais estreita. A torre sineira, quadrangular, está adossada a sul, na fachada principal. A frontaria, com embasamento saliente e rematada em empena recortada, está coroada por cruz latina, alta. Sobressai na fachada o janelão rematado em arco pleno, assente em ornatos vegetalistas.
No interior, no topo da nave, dois retábulos colaterais, em talha pintada e dourada, postos de ângulo. Na capela-mor, retábulo-mor em talha pintada e dourada, com acesso através de três degraus.
Os altares laterais são dedicados a Nossa Senhora da Bonança, do lado do Evangelho, com a inscrição no ático: "ALTAR / DE N. S. / DA BONANÇA. / OFFERTADO / PELOS PES/CADORES / 1893.", e ao Sagrado Coração de Jesus, do lado da Epístola.
De realçar o teto de masseira com painéis, figurando os Mistérios do Terço, e a imagem de Nossa Senhora da Bonança, bem como os símbolos de Vila Praia de Âncora.
Foi esta Capela construída nos finais do século XIX, no lugar da antiga capela da Senhora das Necessidades.
Contexto territorial
As invocações à Senhora – Nossa Senhora da Bonança e Nossa Senhora da Ínsua – delimitam as práticas expressas no contexto territorial desta romaria. É o mar, a costa e a relação entre a comunidade de pescadores de Vila Praia de Âncora e as outras comunidades litorais a dar o sentido. As ‘Aldeias do Mar’, os povoamentos de pescadores que deram origem a vilas e aldeias, a especificidade das vivências sociais e culturais das comunidades marítimas, têm nas práticas religiosas expressões de fé e culturais muito próprias. O mar tem os seus ‘estados de humor’, mas a necessidade leva os pescadores ao mar. O peixe não cai na rede ou morde o anzol quando o pescador quer ou precisa, mostrando como a pesca é a arte do aleatório, da insegurança. Ter alguém a quem solicitar proteção, segurança, quando as ondas cobrem o horizonte, sempre fez parte da cultura marítima. E isso vê-se nos nomes dos barcos, nas inúmeras capelas e ermidas construídas junto dos povoamentos marítimos, nos ex-votos que os pescadores levaram a santuários da costa, da Senhora da Bonança ou na Matriz de Caminha, e até do interior do país, como é o caso dos existentes na Senhora da Abadia. A Senhora da Bonança é essa mãe protetora dos pescadores de Vila Praia de Âncora, como a Senhora da Agonia o é dos de Viana.
Quando vão buscar a Senhora da Ínsua, vão à procura da companheira de todos os dias. Ao cruzarem, no mar, o Forte da Ínsua, apegam-se à imagem milagrosa da Senhora que fez brotar a água, dona e senhora da natureza. A procissão naval, com os andores floridos e engalanados é o evento que faz, num dia de exceção, a celebração dos medos e das graças sempre recordadas à Senhora da Ínsua, que os protege no comum dos dias. Trazê-la no barco é fazer dela um dos membros da campanha, reconhecendo-a na obrigação de os proteger.
Destaques
Forte da Ínsua
O lugar da sua implantação, a lenda que o acompanha, e a paisagem que o envolve, fazem do Forte da Ínsua um monumento ímpar na paisagem do litoral português. Em primeiro lugar, temos ali uma fortificação militar construída sobre um convento religioso, ou seja, as muralhas da fortificação integraram no interior esse convento. A situação estratégica, na embocadura do Rio Minho, em ilhéu já avançado no mar, fronteiro a Moledo do Minho, a cerca de 200m da costa, deu a esta forte relevância merecida, pois tanto defende a costa, como a entrada do rio e até a fronteira norte do litoral português, pois do outro lado está a Galiza.
No campo do lendário está uma das suas particularidades que é bem real: um poço de água doce situado no mar, um dos três únicos existentes no mundo. É a lenda desta água a dar consistência milagrosa à Senhora da Ínsua.
Esta fortaleza abaluartada apresenta planta estrelada irregular composta por dois baluartes poligonais de ângulo, localizados a norte e a oeste, e dois meios baluartes de ângulo unidos por tenalha central, posicionados entre sul e este. A estrutura é unificada por cortinas de traçado plano. No interior o espaço está dividido em duas áreas: i. os quartéis, depósito e cozinha; ii. no restante espaço foi incorporado o convento, de modelo chão bastante sóbrio, formado pela igreja de planta longitudinal, com nave única e sacristia, pelo claustro jónico de planta quadrangular, e pelas dependências conventuais. Foi este Convento de Santa Maria construído em 1392, por uma comunidade cristã franciscana existente na vila de Caminha. Sofreu sucessivas remodelações no século XV e XVI. Poderia já ter alguma estrutura fortificada anteriormente, mas o forte que hoje conhecemos data do reinado de D. João IV, entre os anos de 1649 e 1652, no mesmo esforço de construção de fortificações associado às guerras da restauração. Ele define o início da linha defensiva para a costa, sendo a primeira fortaleza defensiva da linha interior para a fronteira estabelecida pelo rio Minho.
Durante muito tempo a comunidade franciscana coincidiu com a presença dos soldados até à extinção das ordens religiosas em Portugal, já no século XIX. Hoje é monumento nacional.
Contactos
Vila Praia de Âncora, Caminha ( Viana do Castelo )
41.85920792913835,-8.874728553866019 (Ver mapa)