Festa de S. Paio e de Nossa Senhora das Dores
Data: 1º domingo de agosto
A Festa de S. Paio e Senhora das Dores foi muito celebrada, até aos inícios do séc. XXI, no Santuário do Calvário do Bom Jesus. A festa decorria nos inícios de agosto e, em certos anos, as celebrações faziam-se até setembro. Era uma grande festa na comunidade de Gondarém, Vila Nova de Cerveira, invocando santos presentes na capela. Durante anos foi neste Santuário do Calvário do Bom Jesus que se fazia a Peregrinação Arciprestal de Vila Nova de Cerveira.
Tudo concorria para atrair ao culto os devotos: a localização do santuário, no alto da aldeia, virado à paisagem do rio Minho; o próprio espaço do santuário, com as capelas, escadórios e igreja principal, ao bom estilo barroco das igrejas em espaços de tipo ‘monte sagrado’. Para além disso, acreditava-se que a imagem do Bom Jesus do Calvário era muito milagrosa. Sabendo isso, não faltariam romeiros a procurar a sua proteção e poder curativo.
O Santuário será do século XVIII, como atestam as Memórias Paroquiais de 1758, seguindo as ideias do modelo do Bom Jesus do Monte, de Braga. E sendo dedicado ao Bom Jesus do Calvário, ter uma festa e romaria a S. Paio e Nossa Senhora das Dores acontece pela conjugação de interesses comuns perante invocações diversas. O S. Paio, com a sua imagem em pedra, veio para aqui do Convento de Loivo. E com ele vieram também os corpos dos frades sepultados nesse extinto convento. Era um santo de grande devoção no noroeste peninsular, dada a origem galega do mesmo e o seu martírio no tempo da famosa ‘reconquista’. Por sua vez, Nossa Senhora das Dores (da Soledade, da Piedade ou ainda das Angústias) é uma das personagens mais importantes, junto com o Bom Jesus Crucificado, da dramática sequência histórica do sacrifício de Cristo na Cruz, de que a Via Crucis é a narração.
A construção deste Santuário, e como é construído, não só faz do território onde se implanta uma performance do mistério cristão, como concretiza um momento histórico da devoção e piedade centrada na Via Crucis. O poder do Cristo, Bom Jesus, no máximo exemplo de amor, sofrendo e morrendo na cruz, ou seja, fazendo o seu Calvário, é aquele que o romeiro e devoto procura para as suas dores, o calvário da vida, o sofrimento da doença. Juntar a Mãe, Senhora das Dores, o Filho e o Santo Padroeiro do Convento, é ter uma tríade poderosa a quem invocar e ofertar os ex-votos com que cumprem as promessas.
Edificado
Construído em meados do século XVIII e já referenciado no ano de 1758 como santuário em construção, inspira-se na criação do ‘monte sagrado’, como o fez o Santuário do Bom Jesus do Monte, com outra dimensão.
Estava a ser construído em 1758 e teria mais anos de construção, dada a complexidade da proposta construtiva, onde consta um escadório, quatro capelas evocativas das cenas da paixão a ladeá-lo, e uma capela principal. Para além destas arquiteturas, ergueu-se também um parque onde se dispõem árvores e arbustos decorativos, com o fim de se criar a ambiência de paraíso espiritual, pela glorificação e ordenamento da natureza.
O templo principal não tem grandes dimensões, por referência ao seu modelo, mas tem uma torre sineira em três lanços que se destaca, terminando numa esbelta cúpula lobulada. A fachada contracurvada e o conjunto com a janela sobreposta ao portal principal mostram a traça barroca. As inúmeras imagens das capelas e igreja criam todo o cenário da simbólica religiosa da Paixão de Cristo onde está também a imagem de S. Paio do século XVI, de pedra, trazida do Convento de Sampaio de Loivo. No interior da igreja principal sobressai a talha em estilo rocaille e o ‘quadro’ formado por Cristo Crucificado, e, na parte inferior, duas mulheres a ladearem Cristo e Nossa Senhora das Dores, em pranto.
Contexto territorial da romaria
A localização do Santuário do Bom Jesus do Calvário faz-se no interesse de promover um cenário sagrado, onde as arquiteturas construtivas e o espaço organizado concorrem para um quadro visual a impressionar o devoto. A freguesia de Gondarém descai desde os Montes de Góios e da Pena, implantando-se entre a verdura da encosta virada ao rio Minho. É uma paisagem primorosa do Alto Minho onde ao natural se impõe a arquitetura paisagística. As duas conjugadas resultam num espaço de eleição. Não é por acaso existirem aqui belíssimas espécimes arquitetónicas de casa senhoriais que, à qualidade das construções acresce a beleza da paisagem. E não é preciso invocar as ilhas do rio ou a majestade das águas, aqui a aproveitarem-se da abertura do rio, a caminho da foz.
Construir aqui o Santuário foi sobrepor um ato de amor a um ato de beleza. Não conseguiu prevalecer a grande romaria concentrada nos dias festivos, apesar de ela ter grande história e tradição. Prevaleceu o carinho e devoção dos crentes; os rituais de ali fazer romaria e a certeza de acalentar esperança aos pés da Senhora das Dores, companheira dos momentos difíceis; certezas junto da Cruz de Cristo; e louvores na figura de S. Paio, padroeiro e garante de que o sacrifício do martírio trará sempre a salvação.
Destaque
As Casas Senhoriais de Gondarém
Não seria possível a construção de santuários como o do Bom Jesus do Calvário sem benfeitores seguros. É certo que são as esmolas dos pobres, os cristãos que se sacrificam nas promessas, nas romarias, que levantam e preservam grandes santuários e capelas. Mas raras são as vezes, perante santuários desta dimensão, que não concorram para o início do projeto, para a sua conclusão e obras de grande vulto, benfeitores de entre as classes mais ricas e poderosas.
As sociedades do antigo regime eram claramente desiguais, mas também existiam poderosas casas senhoriais, lavradores e brasileiros de torna viagem comprometidos com a comunidade e apostados em engrandecer os espaços e edifícios públicos, religiosos e civis, da sua terra.
Ora Gondarém é terra de grandes casas agrícolas e senhoriais (dos séculos XV, XVI, XVIII, XIX), uma nota distintiva no contexto local. Desde o complexo do Paço do Outeiral (Paço do Outeiral, com sua belíssima Capela de Santa Ana, com belo retábulo e excecionais azulejos; Casa do Presidente, Casa do Caseiro, (atual Hotel Boega), passando pelo Solar da Soleira, a Casa do Mirante, a Casa de Gouvim, a romântica Casa do Souto (Casa dos Bicos), até à Casa da Loureira (Solar dos Cadavais), complexo edifício, que foi evoluindo ao longo do tempo, com sucessivas construções, vindas desde o século XVI ao século XX, passando pelo XVII e XVIII. Daí a convivência dos estilos Barroco, neoclássico e revivalista. Na sua capela, dedicada a Santa Madalena, de estilo neoclássico, sobressaem as talhas e uma Pietá. A destacar também os jardins e um chafariz, oriundo do Convento de S. Paio.
Contactos
Gondarém, Vila Nova de Cerveira ( Viana do Castelo )
41.91524135495279,-8.754273606879368 (Ver mapa)