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Lenda das Bruxas Viajantes


O António andava de uns tempos a esta parte preocupado com o que lhe vinha acontecendo! Ele era um pobre pescador de Lovelhe, ainda jovem, que não fazia mal a ninguém, nem queria mal à mais triste alma. Porque é que haviam de se meter na sua vida? Todos os dias, quando chegava junto do seu pequeno barco para ir à pesca, nunca o encontrava no local onde o havia deixado!

Aquilo parecia coisa do Diabo! António andava desconfiado de um grupo de amigos, que, certamente, lhe estavam a pregar uma brincadeira. Mas ele não era homem de brincadeiras! Naquele dia bem olhava para os companheiros a ver se um sorriso, uma palavra, uma atitude os denunciava. Mas nada! A coisa repetia-se de dia para dia e nenhum sinal dos autores. Aquilo não podia continuar! Não só a pescaria andava perdida, como o sono não o visitava há já algum tempo. Tinha de tomar medidas urgentes!

Depois de arquitetar um plano para descobrir os tratantes, resolveu levá-lo por diante: mal se tinha posto o sol, viera pela calada da noite para dentro do barco, deitando-se por baixo das travessas. Depois foi só resistir ao sono e manter os ouvidos alerta ao mínimo ruído ou movimento.

As horas foram passando, e nada de estranho acontecera. No sino da torre da Igreja já estava a soar a meia-noite. Era tarde demais! António estava para desistir do seu posto de vigilância quando começou a ouvir umas vozes ao longe. Mas aquelas não eram vozes de homem! O que ouvia era um grande alarido de mulheres que falavam em voz alta e riam a bandeiras despregadas. Mas que raio era aquilo, perguntou para si mesmo o pobre do pescador! Ficou cheio de curiosidade, mas não saiu do seu lugar, para não denunciar o plano que tinha, e até porque as vozes vinham na direção do seu barco.

As mulheres entraram para o barco em grande festa e algazarra. Pegaram aos remos e gritaram:

- Vamos irmãs, vamos aos Brasis, terra do nosso contentamento!

E continuaram a rir e a dizerem as coisas mais disparatadas. Bem escondido, o António nem teve tempo para entender bem o que se passava, pois logo o barco estava a parar e as mulheres, que agora o António entendeu só poderem ser bruxas por remarem assim tão depressa, apesar de as conhecer a todas, lá partiram para o meio da floresta. Olhando pela borda, António viu-as desaparecerem pelo meio da folhagem, cantando e dançando, enquanto levantavam as saias em gestos tresloucados.

Entretanto fez-se silêncio e o pescador saiu do barco para ver aquela terra que desconhecia, e aquelas plantas e flores que nunca vira antes! Mas com receio das bruxas, logo regressou ao barco, mas não sem antes tirar uma flor que ali estava, cheia de frescura e de beleza. Novamente escondido no fiando do barco, sentiu António o regresso das bruxas e a viagem de volta. Mais uma vez o barco parou, e as bruxas despediram-se até ao próximo encontro. António resolveu ficar mais um pouco de tempo, até que nenhum ruído lhe chegasse aos ouvidos. No silêncio total, ainda noite naquela manhã de domingo, correu o pobre do pescador para casa, com a flor que recolhera no Brasil.

Estava na hora de ir cumprir a obrigação da Santa Missa de Domingo, e António vestiu o melhor fato, colocando no bolso do casaco uma vistosa flor! Era a que recolhera durante a noite! Na igreja todos notaram a flor de António, mas ninguém estava tão preocupado como um grupo de mulheres que estava no canto esquerdo, mesmo ao fundo da Igreja. No fim da devoção, já quando regressava a casa, uma delas foi ter com o pescador, e avisou-o:

- Se contas a alguém quem somos, o que viste ou ouviste, és um homem morto!

Aquilo assustou deveras o pobre do António! Depois daquele dia nunca mais o seu barco mudou de sítio, mas também ele nunca disse a ninguém o que se passara. Só quando a última das bruxas morreu é que resolveu contar aquela estranha aventura e o nome das bruxas.

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